Na última quinta-feira (23/11/2023), foi publicado no Diário Oficial da União o Decreto 11.795/23, o qual regulamenta a Lei 14.611/23, que dispõe sobre a igualdade salarial entre homens e mulheres. Vemos aqui a intervenção do Poder Legislativo no âmbito empresarial, visando garantir a inexistência de discriminação entre os salários pagos a homens e mulheres que ocupem os mesmos cargos e exerçam as mesmas atividades. Mas a pergunta que não quer calar é: essa intervenção realmente era necessária?

A Lei citada acima, qual seja, Lei 14.611/23, está em vigor desde 04/07/2023, e prevê a garantia de igualdade salarial e critérios de remuneração entre homens e mulheres que exerçam a mesma função. Ainda visa aumentar a fiscalização contra a discriminação, bem como facilitar processos legais.

Mas, como assim, facilitar processos legais? A lei prevê que, em caso de ocorrência de discriminação por motivos de sexo, raça, etnia, origem ou idade, mesmo que haja o pagamento de diferenças salariais, ela não excluirá o direito de ingresso com  uma Reclamação Trabalhista para pleitear indenização por danos morais por aquele que sofreu a discriminação.

Para alguns pode parecer mais uma “balela” feminista, ou um chamariz para mulheres se dizerem discriminadas no ambiente de trabalho.

Contudo, um levantamento estatístico da Justiça do Trabalho indica que, só no ano de 2022, pedidos de equiparação ou isonomia salarial foram objetos de 36.889 processos ajuizados em todo país. Pedidos em decorrência de diferenças salariais tiveram um total de 9.669 processos distribuídos. Apesar do levantamento não apresentar o número desses processos que se referem a diferença de gênero, não é demais pensarmos que uma boa parte dos pedidos possui tal fundamentação.

Quando falamos em valores salariais, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) de 2019, os salários pagos às mulheres representavam 77,7% do valor dos salários pagos aos homens.

Ao adentrar aos grupos de cargos ocupados, a maior discrepância salarial é observada nos cargos de direção e gerência: as mulheres ganham cerca de 61,9% dos salários dos homens.

Mas, qual seria a justificativa para isso? As mulheres rendem menos que os homens?

Não, muitas vezes pode até mesmo ser o oposto disso! Mas, até pouco tempo atrás, as mulheres não possuíam direitos, sendo que para diversas atividades dependiam da autorização de seus maridos ou familiares. O seu ingresso no mercado de trabalho também não vem de muito tempo, já que as mulheres eram vistas como as responsáveis pelo lar e família, enquanto os homens eram os provedores.

Tal pensamento ainda se mostra enraizado em nossa comunidade, tanto que, em pleno 2023, se fez necessária a criação de uma Lei e um Decreto para garantirem a percepção de salários iguais para exercentes da mesma função, independentemente de seu gênero.

Para a Ministra do TST, Liana Chaib, não há justificativas para o pagamento de salários diversos para ocupantes do mesmo cargo:

“Se eles exercem as mesmas funções, no mesmo local e com o mesmo grau de perfeição técnica e, no entanto, um deles é mais bem remunerado, estamos diante de um desvirtuamento inexplicável”.

Mas não se engane: a Lei de Isonomia Salarial não se aplica apenas e tão somente para pedidos formulados por mulheres. Ela também se aplica a trabalhadores, na medida em que não pretende favorecer nenhum gênero, mas apenas garantir a isonomia entre todos, independente de qualquer critério subjetivo.

Ok, entendi, mas o que preveem essa Lei e esse Decreto?

Os principais pontos da Lei são:

  • Alteração do valor da multa prevista no artigo 510 da CLT, aplicada a empresas que não possuem isonomia salarial entre homens e mulheres. Agora, a multa será de dez vezes o novo salário devido pela empresa ao trabalhador ou trabalhadora discriminados.
  • Prevê que empresas com 100 ou mais empregados deverão divulgar, semestralmente, relatórios de transparência salarial, garantindo o anonimato dos dados pessoais. A intenção é possibilitar a comparação entre os salários pagos a trabalhadores e trabalhadoras e verificar a existência efetiva da isonomia.
  • Caso identificada desigualdade salarial ou de critérios remuneratórios, as empresas privadas deverão criar planos de ação para mitigá-los, prevendo metas e prazos, além de garantir a participação de representantes das entidades sindicais e de representantes dos empregados nos locais de trabalho.
  • Por fim, prevê a criação de canais específicos para denúncia, um incremento na fiscalização, a promoção de programas de inclusão no ambiente de trabalho, bem como o incentivo à capacitação e formação de mulheres para o ingresso, permanência e ascensão no mercado de trabalho, em igualdade de condições com os homens.

Já o Decreto pormenoriza os pontos trazidos acima, como, por exemplo, os campos que o relatório de transparência deve possuir, as exigências do Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial, dentre outras questões.

Após toda a explicação trazida acima, a conclusão que eu chego é de que, infelizmente, se mostrou necessária a intervenção legislativa para regulação de uma questão que deveria ser decisão apenas no âmbito corporativo.

A desigualdade existe e de forma escancarada, sendo que apenas se tentava “tapar o sol com a peneira”, sem efetivamente se alterar o real problema.

Ao se manter inerte para acompanhar as atualizações do mercado de trabalho, bem como reconhecer o efetivo valor de todos aqueles que ocupam o mesmo cargo, independente de gênero, o Poder Legislativo teve que intervir, para garantir que o preconceito não tenha lugar no âmbito salarial.

Quem sabe daqui algum tempo possamos dizer que essa previsão legal não é mais necessária, tendo em vista que todos já aceitamos que salário remunera o serviço prestado e não o gênero de quem o presta!

Aos empresários, importante observar todas as previsões, para que se evitem fiscalizações desnecessárias e até mesmo aplicação de multas. Caso necessite de ajuda, nos procure!

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