No final de 2023, o Plenário do Superior Tribunal Federal, ao analisar o Recurso Extraordinário nº 860.631, proferiu decisão que provocou grande repercussão.

Dessa vez, surpreendentemente, não se trata de controvérsia envolvendo os Poderes Legislativos e o Judiciário, mas de análise da legalidade quanto ao procedimento de retomada de imóvel financiado e garantido por meio de alienação fiduciária em caso de inadimplemento do adquirente, contudo, sem submeter ao crivo do Judiciário.

A alienação fiduciária, tratando-se de meio de garantia, é usualmente utilizada como forma de financiamento, de modo que o comprador/devedor do imóvel financia o valor com uma instituição financeira, tendo exclusivamente a posse do bem (propriedade resolúvel) e, em contrapartida, a propriedade permanece em nome da instituição financeira que o financia enquanto não quitado integralmente o montante.

A Lei 9.514/97, que regulamenta o instituto, sancionada em momento de crise habitacional, teve como objetivo também proteger o direito de permanência no imóvel àquele que o financia, e a possibilidade de oferecer ao credor/proprietário (instituição financeira) de se valer de medidas extrajudiciais para retomar a posse do bem, caso o pretenso adquirente deixe de honrar com sua obrigação de pagamento.

Desse modo, a legislação autoriza a consolidação da propriedade em nome do credor/agente fiduciante, a partir da apuração do valor devido, com incidência de juros, correção monetária e demais encargos para a quitação da dívida.

Ocorre que foi suscitada a ilegalidade desse procedimento, na hipótese de retomada do imóvel fora da esfera judicial no caso de inadimplemento contratual por parte do adquirente do bem, em que pese haver autorização expressa na mencionada Lei.

Assim, o STF decidiu pela constitucionalidade do procedimento extrajudicial, distanciando-se de qualquer tese no sentido de que o mesmo fere o direito de defesa ou a garantia de acesso ao Judiciário.

Isso posto, os Ministros declararam de modo expresso que deve ser observado o procedimento previsto na Lei 9.514/97 e garantiram o direito do devedor de se socorrer ao Judiciário a qualquer momento, caso seja verificada incompatibilidade entre o procedimento extrajudicial e o quanto previsto na legislação.

Ainda o Ministro Luiz Fux, cujo voto foi vencedor, destacou que a Lei não apenas respeita disposições constitucionais e normas processuais, como, muito embora seja procedimento extrajudicial, realiza-se perante o Oficial de Registro de Imóveis, que, como é sabido, exerce atividade estatal delegada. Ou seja, o procedimento é executado por meio de serviço público, sujeitando-se à fiscalização do Estado, trazendo, portanto, segurança jurídica às partes envolvidas.

A consolidação da propriedade de modo extrajudicial é uma forma de impulsionar o mercado imobiliário, posto que não é surpresa a ninguém a morosidade judicial na atualidade. Além do mais, a celeridade e a eficiência oferecem mais segurança ao investidor em caso de inadimplemento, ao mesmo passo que garantem ao devedor forma de quitar o débito até a data da realização do segundo leilão, evitando-se a perda do bem.

O procedimento em comento deve ser visto como inovação trazida pela Lei, o que propicia o desenvolvimento do sistema habitacional, com a redução de juros e ampliação das oportunidades de financiamento.

Importante frisar que o procedimento não enseja a prática de atos ilegais, bem como não fere direito constitucional, pelo simples fato de o trâmite ocorrer perante registro imobiliário, uma vez que o devedor pode se socorrer a qualquer momento do Judiciário. Aliás, há etapas a serem observadas, antes da consolidação, tais como: intimação do devedor sobre o débito para possível quitação, perante o cartório de registro de imóvel, para, após o prazo concedido, então se prosseguir com a consolidação e o leilão do bem.

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