O Brasil, historicamente marcado pela presença da escravidão durante séculos, enfrenta desafios persistentes no combate ao trabalho escravo contemporâneo.
No último dia 28 de janeiro chegou-se ao debute do Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, onde não há que se falar em comemoração, diante de um tema que já deveria estar, há muito tempo, erradicado das notícias e discussões atuais, mas sim, rememorar a luta que se mantém ainda hoje.
A Lei 12.064/2009 instituiu o dia 28 de janeiro como o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, após três auditores fiscais do trabalho serem assassinados durante inspeção em uma fazenda, acusada de trabalho escravo, na região de Unaí (MG). Na ocasião, o motorista Ailton Pereira de Oliveira e os auditores fiscais do trabalho Nelson José da Silva, João Batista Lage e Eratóstenes de Almeida Gonçalves foram executados, a mando de empresários descontentes com a atuação da equipe, que investigava denúncias de trabalho escravo na região.
Referida Lei buscou tornar o dia um marco no combate ao trabalho escravo no Brasil, com o objetivo de não somente homenagear os executados, mas principalmente almejar maiores avanços na luta contra a prática abusiva e primitiva que ainda presenciamos atualmente.
Apesar dos avanços legais e institucionais ao longo dos anos, a exploração de trabalhadores em condições análogas à escravidão ainda persiste em várias regiões do país.
A história do Brasil está profundamente enraizada na escravidão, que deixou marcas indeléveis na sociedade e na economia brasileira. A abolição oficial ocorreu em 1888, com a Lei Áurea. No entanto, a transição para um sistema de trabalho livre e justo foi, e ainda é, extremamente desafiadora. Desde então, não bastou abolir, na teoria, as condições degradantes e desumanas a que trabalhadores abusados eram expostos, pois muitas formas de exploração persistiram na prática e foram aprimoradas, culminando na forma contemporânea de trabalho escravo.
A forma moderna da escravidão é caracterizada por condições degradantes, jornadas exaustivas, restrição de liberdade e ausência de remuneração adequada, apenas para citar as principais e mais usuais.
Frequentemente, os trabalhadores são submetidos a situações de coerção, violência física e psicológica, privação de direitos básicos e negação da dignidade humana. Essa realidade persiste em setores como agricultura e pecuária, principalmente, mas também se encontra em diversos outro setores, como construção civil, indústria têxtil, entre outros, e afeta especialmente trabalhadores migrantes, indígenas e em situação de vulnerabilidade social.
Segundo dados do Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas, entre 1995 e 2022, 57.772 pessoas foram resgatadas de condições de trabalho análogas à escravidão no país. Mais de 80% das vítimas resgatadas em 2022 se declararam pretas e pardas. Na maioria são homens com idade entre 18 e 29 anos e ocupações no setor agropecuário, em trabalhos como criação de bovinos e cultivo de cana-de-açúcar (https://smartlabbr.org/trabalhoescravo).
Em 2023, o TST instituiu o Programa de Enfrentamento ao Trabalho Escravo, Tráfico de Pessoas e Proteção ao Trabalho do Migrante, após uma fiscalização em 22 Estados do Brasil e no DF, em que 532 trabalhadores foram encontrados em situação de trabalho análogo à escravidão, a maioria no meio rural.
O combate a essa prática criminosa é respaldado por uma série de instrumentos legais e políticas públicas, que visam garantir a proteção dos direitos humanos e trabalhistas dos cidadãos. Dentre os principais marcos legais, destaca-se a Constituição Federal de 1988, que estabelece a dignidade da pessoa humana como um dos princípios fundamentais da República (art. 1º, inciso III).
Esse princípio está evidenciado no “caput” do art. 7º da Constituição Federal, dispondo sobre os “direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social.”
O texto constitucional já destaca ––no anterior art. 6º, que inicia o Capítulo II, intitulado: “Dos Direitos Sociais” – a importância dos direitos sociais trabalhistas como forma de melhoria da condição social do trabalhador, e também assegura o “status” desses direitos como fundamentais, por inseridos no Título II, que trata “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”.
Diante da importância e da característica protetiva do trabalho, da hipossuficiência do trabalhador e do estado de subordinação próprio da relação de emprego, não há possibilidade de o empregado abrir mão de direitos previstos na legislação, ou nas demais fontes do direito trabalhista, à exceção quando houver autorização legal, ou o trabalhador puder expressar livremente sua vontade.
Não à toa, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) é um dos instrumentos legais que mais se atualiza, se altera e se molda à realidade fática do país, buscando coibir e combater práticas que levam a condições degradantes dos trabalhadores. Felizmente verifica-se cada vez mais a adesão de empresas a práticas humanizadas, buscando não só o bom desempenho de seu empregado, mas também o seu bem-estar social.
Além disso, a Lei nº 13.344/2016 define o crime de redução à condição análoga à de escravo e estabelece penas para os responsáveis por essa prática criminosa. O Brasil também é signatário de convenções internacionais, como a Convenção 29 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que proíbe o trabalho forçado ou compulsório.
Apesar dos avanços legislativos e das ações de fiscalização, o combate ao trabalho escravo contemporâneo ainda enfrenta desafios significativos no Brasil. A fragilidade das políticas públicas, a impunidade dos infratores, a falta de conscientização e a complexidade das cadeias de produção são alguns dos obstáculos que dificultam a erradicação dessa violação dos direitos humanos.
É fundamental que o Estado, a sociedade civil e o setor privado atuem de forma conjunta e coordenada para enfrentar esse problema de maneira eficaz. Investimentos em educação, formação profissional, regularização fundiária e fortalecimento das instituições são medidas essenciais para prevenir e combater o trabalho escravo em todas as suas formas.
Além disso, a promoção do diálogo social, o respeito aos direitos trabalhistas e a adoção de práticas sustentáveis nas cadeias de produção são aspectos fundamentais para se construir uma sociedade mais justa e igualitária.
A legislação trabalhista vigente e as políticas de proteção dos trabalhadores desempenham um papel crucial nesse processo, mas é necessário um esforço conjunto e contínuo de todos os setores da sociedade, para se enfrentar e superar os desafios que ainda persistem!
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