O contrato de financiamento imobiliário é uma das principais formas de aquisição da casa própria no Brasil. Por envolver obrigações de longa duração, é natural que fatores econômicos, sociais e territoriais interfiram em sua execução. Nesse cenário, a significativa desvalorização do imóvel pode gerar desequilíbrio contratual, especialmente quando o valor de mercado do bem torna-se inferior ao saldo devedor restante.
Esta situação compromete o equilíbrio da relação jurídica, podendo ensejar a revisão das cláusulas contratuais com base na teoria da imprevisão, e nos princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato. O presente artigo tem como objetivo analisar a possibilidade jurídica dessa revisão à luz do ordenamento jurídico brasileiro, sobretudo no contexto pós-pandemia e de reconfiguração urbana.
A desvalorização de imóveis pode decorrer de diversos fatores: deterioração urbana, violência, poluição, alagamentos, baixa demográfica, ausência de infraestrutura ou mudanças socioeconômicas. Quando esta desvalorização ocorre de forma significativa e não previsível no momento da contratação, surgem discussões quanto à manutenção da equidade entre as prestações assumidas pelas partes.
Se o bem dado em garantia — o imóvel — perde valor de forma acentuada e permanente, a prestação assumida pelo consumidor torna-se desproporcional, caracterizando onerosidade excessiva. É neste contexto que surge a possibilidade de revisão judicial do contrato.
O fundamento jurídico da revisão contratual consiste na teoria da imprevisão, prevista no artigo 478 do Código Civil, que dispõe:
“Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.”
A jurisprudência e a doutrina evoluíram para admitir a revisão contratual como alternativa à resolução, com base nos princípios da conservação do contrato e da função social. Assim, se a desvalorização decorre de eventos externos e imprevisíveis — como reestruturação urbana, crise econômica ou êxodo populacional —, é cabível a revisão das obrigações.
Também o Código de Defesa do Consumidor, especialmente nos seus artigos 6º, incisos V e VI, prevê a modificação de cláusulas contratuais que se tornem excessivamente onerosas, e a proteção contratual em casos de fatos supervenientes que dificultem ou impeçam a execução.
O contrato de financiamento imobiliário, embora firmado com instituição financeira, é regido pelas normas consumeristas, pois configura relação de consumo. Assim, o mutuário pode invocar a vulnerabilidade do consumidor e a boa-fé objetiva, para fundamentar seu pedido de revisão contratual.
A jurisprudência ainda não é pacífica sobre o tema, mas já existem precedentes que acolhem a tese da revisão em virtude da desvalorização do imóvel. Outro exemplo relevante envolve áreas afetadas por tragédias ambientais ou pela violência urbana.
Apesar disso, alguns julgados mantêm posição mais conservadora, exigindo comprovação robusta do nexo entre o evento imprevisível e a desvalorização do bem.
Entrementes, deve-se destacar que há limites e requisitos da revisão contratual, que dão segurança ao negócio jurídico.
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