Nos últimos anos, o mercado de trabalho brasileiro passou por mudanças significativas que incentivaram a flexibilização das formas de contratação, inclusive com importantes posicionamentos do STF, embora muitas vezes possam parecer conflitantes com as decisões do TST.
Um dos modelos que ganhou destaque foi a contratação de trabalhadores como pessoas jurídicas (PJ) ou autônomos. Embora essa prática seja comum e, muitas vezes, vantajosa para ambas as partes, ela pode gerar riscos para as empresas, especialmente no que se refere ao reconhecimento de vínculo empregatício. Neste texto, abordaremos os principais cuidados que as empresas devem ter ao contratar prestadores de serviços nessa modalidade, evitando problemas trabalhistas e minimizando o risco de passivos futuros.
O ponto inicial para compreender os riscos da contratação de autônomos ou PJ é entender a distinção fundamental entre essas modalidades e o contrato de trabalho tradicional regido pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O trabalhador autônomo, seja ele uma pessoa física ou jurídica, presta serviços de forma independente, sem a subordinação característica de um contrato de trabalho. No caso do empregado CLT, quatro elementos essenciais configuram o vínculo empregatício:
No caso do prestador de serviços PJ ou autônomo, não há subordinação direta, o que significa que ele tem autonomia para realizar suas atividades, sem a necessidade de seguir ordens rigorosas, horários fixos ou estar presente em um ambiente controlado pela empresa.
Com a crescente necessidade de adaptação a um mercado dinâmico e competitivo, muitas empresas optam por contratar prestadores de serviços como PJs, buscando reduzir encargos trabalhistas e aumentar a flexibilidade operacional. No entanto, essa prática pode gerar o reconhecimento do vínculo empregatício, caso não sejam observados alguns cuidados importantes. Se, ao longo da relação, forem detectados elementos que se assemelhem ao contrato de trabalho formal, como subordinação e habitualidade, a Justiça do Trabalho pode determinar o reconhecimento do vínculo.
Um exemplo emblemático desse cenário é a ADPF 324, julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que trouxe maior clareza quanto à terceirização de atividades-fim, ampliando a possibilidade de contratação de PJs sem o reconhecimento automático de vínculo. No entanto, isso não elimina a necessidade de precaução.
Cabe destacar que o STF tem posição firme, no sentido de reconhecer a validade constitucional de terceirizações ou outra forma de relação de trabalho, em observância ao que foi decidido no julgamento da ADPF nº 324/DF, ADC nº 48, ADI nº 3.961 e ADI nº 5.625.
Entretanto, para evitar que o prestador de serviços seja considerado empregado, algumas práticas devem ser adotadas pela empresa, adotando os cuidados essenciais para minimizar os riscos de reconhecimento de vínculo empregatício:
Redução da Subordinação
A subordinação é um dos principais elementos que caracteriza a relação de emprego. Ao contratar um PJ ou autônomo, é fundamental que a empresa preserve a autonomia do prestador de serviços, evitando lhe impor controle rígido sobre a forma de execução do trabalho, como horários fixos ou cumprimento de ordens específicas. O autônomo deve ter liberdade para escolher como e quando desempenhar suas atividades, sem a necessidade de reportar-se diretamente a um superior.
Flexibilidade na Prestação de Serviços
Outro ponto crucial é garantir que a prestação de serviços não tenha um caráter contínuo e habitual. Embora o prestador possa atuar em projetos específicos ou por um período determinado, é importante que sua atuação não se confunda com as rotinas diárias da empresa. Manter contratos por tempo indeterminado e exigir presença constante podem ser elementos que geram risco de reconhecimento de vínculo.
Utilização de Contratos Bem Elaborados
A formalização do contrato de prestação de serviços é uma etapa indispensável para a contratação de PJs ou autônomos. Esse documento deve ser redigido com clareza, especificando as condições da prestação, as responsabilidades de ambas as partes e a autonomia do prestador. O contrato deve evitar cláusulas que indiquem subordinação ou controle excessivo por parte da empresa.
Além disso, é essencial que o contrato preveja a não exclusividade da prestação de serviços. O prestador deve ser livre para atuar em outros projetos e com outros clientes, o que reforça sua condição de autônomo.
Separação Entre Benefícios e Ferramentas de Trabalho
Para evitar a configuração de vínculo empregatício, a empresa deve se abster de conceder benefícios trabalhistas típicos, como férias, 13º salário ou participação em planos de saúde e previdência. Esses benefícios são característicos de uma relação empregatícia e, ao oferecê-los, a empresa pode fortalecer a ideia de que há um vínculo de trabalho.
Da mesma forma, o prestador de serviços PJ ou autônomo deve utilizar suas próprias ferramentas e equipamentos para realizar o trabalho. O fornecimento de material por parte da empresa pode indicar um nível de controle e subordinação indesejado.
Consequências do Reconhecimento de Vínculo
Caso a Justiça do Trabalho reconheça a existência de um vínculo empregatício disfarçado de contratação de PJ ou autônomo, as consequências para a empresa podem ser severas. A empresa poderá ser condenada ao pagamento de todos os direitos trabalhistas devidos ao empregado, como férias, 13º salário, FGTS, horas extras, adicional de insalubridade ou periculosidade, entre outros.
Além disso, há a possibilidade de condenação ao pagamento de multas e encargos previdenciários sobre os valores não recolhidos durante o período de prestação de serviços, o que pode gerar um passivo significativo. Portanto, é crucial que as empresas adotem práticas preventivas para evitar esse tipo de problema.
A contratação de PJs e autônomos pode ser uma estratégia eficaz para as empresas que buscam flexibilidade e redução de custos. No entanto, é indispensável que a empresa observe rigorosamente os cuidados necessários para evitar o reconhecimento de vínculo empregatício. Garantir a autonomia do prestador de serviços, utilizar contratos bem elaborados e evitar a concessão de benefícios típicos de empregados são algumas das medidas fundamentais para mitigar esse risco.
Com o devido cuidado, é possível estabelecer relações de trabalho mais flexíveis e vantajosas tanto para a empresa quanto para o prestador de serviços, sem incorrer em litígios trabalhistas!
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