Há um ditado que diz que aquilo que não está escrito em pedra, pode ser mudado. Será mesmo?

Diante dos avanços tecnológicos dos últimos anos, a forma de fazer as coisas mudou muito. O celular – ou o uso dele – é um perfeito exemplo disso, e gostaria de utilizá-lo para resumir este meu ponto de vista nesta reflexão.

Não é incomum encontrar pessoas mais velhas pedindo o auxílio dos mais novos para entender como esses aparelhos funcionam. Há quem acredita que essas “modernidades” digam respeito somente às gerações mais novas. No entanto, todos somos afetados, seja pelo nosso uso efetivo do equipamento, ou até mesmo pela forma como nos comunicamos no geral, e também por termos acesso às informações, querendo ou não. Hoje, caso queiramos saber sobre algo que está acontecendo do outro lado do mundo, é possível estabelecer contato em tempo real. Tudo isso na palma de nossas mãos!

Quanta responsabilidade!

Talvez não tenhamos ainda os carros voadores que os filmes futuristas do começo do século previram, mas ainda assim já caminhamos um bocado, e isso tem diversas consequências no mundo jurídico.

A 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em 04 de setembro último considerou1 o teor de mensagens trocadas por WhatsApp como prova para condenar empresários que cobravam uma dívida inexistente. A condenação foi para que pagassem em dobro o valor cobrado de forma irregular, com fulcro no artigo 940 do Código Civil.

Esse posicionamento é relevante por diversos motivos, mas gostaria de focar em apenas dois, e te convidar para pensar um pouco sobre eles.

Em primeiro lugar, necessário se faz reconhecer que não há como fugir da responsabilidade que nosso “rastro digital” nos traz. Como no caso descrito, a troca de mensagens, onde as partes combinavam a entrega do dinheiro e condições de pagamento, bem como a confirmação posterior do recebimento desses valores, foi suficiente para atribuir culpa a uma das partes.

Vale dizer, inclusive, que as partes sucumbentes foram quem ingressaram com a ação de cobrança – de modo que se configurou clara má-fé ao exigirem dívida inexistente. Ou seja, até para “aprontar” ficou muito mais difícil!

Em segundo lugar, percebe-se como o Direito, apesar de manter sua tradição (inclusive para não se ter insegurança jurídica), é um dos primeiros a ser afetado pelas tecnologias. No caso apresentado, o impacto foi positivo e merece ser reconhecido.

Apesar de não haver a previsão expressa a respeito de mensagens de texto como prova documental, sua possibilidade é amparada pelo teor do artigo 369 do Código de Processo Civil, que determina que: “As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz”.

Com base nisso, ao analisar o conjunto probatório apresentado pelos réus, o relator da apelação, o desembargador Azuma Nishi, destacou: “Forçoso concluir que individualmente considerados, tratam-se de indícios, mas a análise global indica, com elevada segurança, que o pagamento foi efetuado de acordo com o quanto alegado pela defesa”.

Além deste caso, existem muitos outros que mostram como a transmissão da informação por esses meios de comunicação podem ser utilizados pelo Direito, em busca de uma solução justa nos casos que surgem. A morte da estudante Mariana Bazza, que foi cruelmente assassinada no final do mês passado, também foi solucionado por conta de uma foto que ela enviou no WhatsApp ao namorado.

Sendo assim, importante reconhecer que apesar dos diversos aspectos negativos que essa carga de informação nos traz como comunidade global, tem sido possível auferir resultados positivos na aplicação do Direito, o que acarreta um natural impacto social.

É possível observar diversas movimentações no âmbito jurídico, se preparando para essas mudanças que tem acontecido, como a utilização de novos recursos probatórios, por exemplo, no âmbito do Processo Civil (como citado acima), bem como de forma mais ampla e global, como por exemplo, a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados). Será que isso se fará suficiente?

Arrisco dizer que com certeza não. Mas será um começo!

Sendo assim, que nós, como profissionais do Direito, possamos continuar a explorar essas tecnologias e “modernidades” de forma positiva, utilizando-as de forma coerente, a fim de fazermos boas escolhas e colhermos como resultados julgamentos justos!

  1. Apelação nº 1056057-90.2015.8.26.0100 ↩︎
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