No mês em que se comemora o “Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil”, instituído pela “Organização Internacional do Trabalho – OIT”, vivenciamos um cenário de incertezas relativamente ao modo pelo qual enfrentar-se-á a questões como a exploração da mão de obra infantil e a sua irremediável “naturalização”, culminando em diversas situações de explosão no número de menores trabalhando, os quais acabam desprovidos de proteção, têm, ainda, prejudicado o seu desenvolvimento socioeducacional.

O ciclo é perverso e nosso sistema, infelizmente, reforça, ainda que sem intenção, a manutenção exploratória.

A pandemia e o trabalho infantil podem parecer questões totalmente dissociadas, mas estão umbilicalmente ligadas pela constatação de que, historicamente, os momentos de recessão econômica sempre foram explorados como oportunidades para a introdução de novos vieses, políticos e econômicos de desigualdades sociais, reforçando a noção de parcialidade de parte do empresariado brasileiro em detrimento da dignidade do trabalhador.

Nas discussões envolvendo a sobrevivência da economia e a manutenção do emprego, o respeito à dignidade da pessoa humana, parece não convergir – ou, não temendo ser dramático, até mesmo existir –. Explico: a atuação do Estado na tentativa de garantir a perpetuação e linearidade econômica, exprimida por meio de medidas que flexibilizam a relação entabulada entre empregado e empregador, imporá a necessidade de novas interpretações não só das relações de trabalho, mas de seus limites mais nobres, objetivando a harmonização do sistema como um todo, conferindo proteção as diferentes camadas sociais para o enfrentamento da recessão.

Frente ao agravamento da desigualdade social, do aumento das taxas de desemprego, da pobreza e na reflexa ausência escolar – decorrente não só da incapacidade financeira de manter os filhos em escolas, mas também da inaptidão do Estado em estruturar, real e efetivamente, a escola pública para realizar aulas à distância –, vislumbra-se lamentavelmente esperada a tendência de crescimento do trabalho infantil e adolescente, haja visto a necessidade de ajudar os pais no sustento da família e o desinteresse na educação formal, os quais representam as raízes do trabalho infante.

Neste sentido, necessário destacar que há uma diferença entre o exercício de um ofício familiar pela criança e o trabalho propriamente dito, ou seja, não há nada que impeça uma criança de aprender um ofício da família; contudo, a obrigação da contraprestação financeira e o cumprimento da jornada de trabalho é proibido pela nossa legislação, sendo possível apenas a inserção de menores na vida laboral no caso de se tratar de contrato de menor aprendiz – o qual ainda assim exige a idade mínima de catorze anos completos ( o art. 428 da Consolidação das Leis do Trabalho).

É fato que, muitas crianças e adolescentes deixam de frequentar a escola por tempo indeterminado para permanecerem em casa, assumindo as atividades de seus responsáveis, cuidando de irmãos mais novos e demais reponsabilidades domésticas em razão da flexibilização de alguns serviços essenciais.

Seria, este, um novo escopo da exploração do trabalho infantil?

Ademais, sem descartar a principal causa da antecipação do trabalho por menores de idade, qual seja, o auxílio ao custeio financeiro familiar, como será enquadrada a situação de crianças que, tendo seus pais trabalhando remotamente dentro de casa, serão obrigadas ao trabalho doméstico – ainda que, simplesmente, cuidado do seus irmãos?

Enfim, na iminência do retrocesso, a necessidade de políticas positivas e inclusivas amparadas pela atuação de um Estado fortalecido é crucial para amortização de questões como o trabalho infantil no médio e longo prazo. Nesse sentido, a promoção de programas que reforcem ou desenvolvam novas perspectivas para os jovens afetados é imprescindível na luta por uma sociedade menos injusta.

A nova realidade que se apresenta para o contexto brasileiro possui consideráveis desafios a serem vencidos, principalmente para a eliminação do trabalho infantil, o qual ganhou relevante proporção. A tentativa de mensurar as consequências não é palpável, porém a conjuntura não parece favorável, evidenciando que as condições que afloram ao aparecimento e crescimento do trabalho infantil estarão cada vez mais presentes.

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