Recentemente eu fui consultado a respeito de um assunto que ao analisar o caso com calma fui surpreendido com a falta de uma solução jurídica. O cliente, reconhecido comerciante, estava diante de uma excelente proposta de venda de uma propriedade sua no litoral sul de São Paulo.
Há tempos aquela casa estava a venda sem que nenhum interessado aparecesse. Primeiro em razão da crise, segundo porque a casa não era lá essas coisas. O imóvel estava há tantos anos nessa situação, sem nenhuma proposta, que o seu proprietário houve por bem fazer dinheiro de outra forma, hipotecando-o junto ao seu principal fornecedor para obtenção de crédito e melhores condições comerciais, fomentando assim o seu negócio. E agora, gravado o bem com a hipoteca, ainda vigente, o comerciante recebeu aquela tão esperada proposta de compra, alimentando o seu sonho de inclusive injetar mais capital no seu negócio como produto da venda. Mas o gravame estava lá e precisava ser liberado para que o negócio avançasse, afinal de contas o interessado não assumiria o risco, eis que de louco não se tratava, de adquirir um bem hipotecado. O comerciante negociou por várias semanas com seu credor a substituição da garantia, ofertando em troca um bem mais valioso, livre e desembaraçado e localizado em Campinas, sede dos seus principais negócios. Ou seja, o comerciante tinha em mãos um bem mais valioso e com maior liquidez a oferecer em troca daquele hipotecado, de menor valor comercial, com baixa liquidez e localizado no litoral. Depois de muita negociação sem que a um bom termo chegassem as partes, e vendo aquela oportunidade de venda do bem se esvair, o comerciante me procurou. Haveria uma saída legal para forçar o credor hipotecário a aceitar a substituição do bem hipotecado por outro, melhor avaliado, melhor localizado e livre e desembaraçado? Essa foi a missão a mim conferida. O que estava a levar o credor hipotecário a negar a substituição da garantia eram retaliações comerciais, birras negociais, uma forma de mostrar poderio econômico e a forçar uma melhora no relacionamento comercial entre as partes. Em razão da crise por que passava o setor a relação entre as partes não estava em seu melhor momento, ainda que nenhum débito estivesse vencido, esse sim um impeditivo, ainda que relativo, para a substituição do bem hipotecado. O fornecedor estava a simplesmente negar a substituição e a liberação do imóvel litorâneo sem nenhuma justificativa plausível. Assumindo o trabalho de buscar uma solução jurídica para o caso me deparei com uma lacuna legal, não obstante os avanços legislativos do Código Civil e do novo Código de Processo Civil. Não há nenhum comando jurídico que obrigue o credor hipotecário a aceitar a substituição do bem ofertado em garantia, quando vigente as condições da hipoteca, ainda que o bem a ser substituído seja “melhor”. E assim o comerciante/devedor irá perder um importante negócio, cujo produto seria inclusive injetado no próprio negócio, simplesmente porque o credor assim não faz a mínima questão de cooperar, certamente como uma forma de lhe pressionar por maiores e mais variadas compras e menores prazos para pagamento. Uma verdadeira incongruência. Eu entendo que nos negócios impera o princípio do hedonismo, que não se compadece com simpatias comerciais. Mas neste caso não havia motivo juridicamente aceito a negar a substituição da garantia. E, fazendo valer os princípios da minha formação profissional, não aceitei aquela situação pacificamente e notifiquei extrajudicialmente o credor a providenciar a substituição do bem hipotecado, já indicando o novo imóvel, devidamente avaliado, no prazo de trinta dias, sob pena das medidas legais cabíveis. Embora notificado, o fornecedor nada fez, ou como gostamos de dizer, quedou-se inerte. Agora, como um bom cão que late, terei que morder. Mas o remédio judicial a ser adotado, e a sua eficácia, ficarão para o meu próximo texto. Afinal, o verão está logo aí e a casa na praia não foi vendida, portanto, deixemos o comerciante aproveitar com sua família.
Advogado Sócio da Advocacia Hamilton de Oliveira. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-CAMPINAS). Administrador de empresas pela Fundação Getúlio Vargas (FGVSP). Especialista em Direito Contratual pelo Centro de Extensão Universitária (CEU). Especialista em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Das suas passagens profissionais, vale destacar atuações junto ao Banco Mercantil de São Paulo (hoje Banco Bradesco), junto à Arthur Andersen (hoje Deloitte Touche Tomatsu) e junto ao Banco e Corretora Patente S/A.
Tem dedicado sua prática à área do Direito Empresarial e ao Direito Civil, especialmente no ramo do Direito Imobiliário com ênfase em incorporação imobiliária e condomínio edilício.
Membro do Conselho Deliberativo da OABPrev-SP no triênio 2021/2023.
Idiomas: Português e Inglês.