A instauração de um conflito qualquer, por si só, já é um fato social complicado. Duas razões, duas certezas, em choque, pois uma se contrapõe à outra. De discussões futebolísticas a interpretações subjetivas de um contrato, passando por diversas espécies de relações interpessoais, o conflito parece ser inerente à natureza humana. Havendo mais de um indivíduo, pronto, já há disponibilidade para uma boa briga.

As motivações, em simples análise, podem ser conscientes, quando alguém entende que o outro invadiu o seu espaço, por exemplo, ou inconscientes, influenciados por marcas culturais e sociais.

Pois bem. Nas relações familiares isso não é diferente. Independentemente do gatilho que tenha iniciado eventual desequilíbrio entre os envolvidos, o certo é que, ladeira abaixo, diversos fatores invisíveis ao consciente influenciam negativamente na superação do conflito e no restabelecimento da paz ou, ao menos, da harmonia.

No ambiente familiar, mesmo sem conflito evidente, há uma espécie de dança comportamental, onde se entrelaçam as histórias pessoais de cada um dos indivíduos. Essa dança não se vê e raramente é percebida. Ela simplesmente acontece.

Ascendentes, descendentes, colaterais e cônjuges ou companheiros, todos estão envolvidos, cada qual dentro de sua particularidade, em uma teia de relacionamentos e conexões interpessoais de valorizações, ou desvalorizações, mútuas, e acolhimentos condicionais, mas sempre, ou quase sempre, com muito afeto.

Nesse contexto, ou melhor, nessa dança, por diversas vezes sem se dar conta, os indivíduos podem começar a notar um ruído em determinadas conexões e, ainda sem saber exatamente o que está se passando, percebem que os ruídos podem evoluir para pequenas avalanches até que, de repente, já se tem um conflito instaurado, recheado por mágoa, rancor e tantas outras emoções negativas.

Estas emoções, por sua vez, cegam (ainda que temporariamente) os olhos da razão e impulsionam atitudes também negativas, motivadas, talvez, pelo instinto da autopreservação, e lesivas ao outro.

Nasce, então, a necessidade de medidas judiciais protetivas, seja contra ameaças físicas, seja para evitar desvios patrimoniais, seja, ainda, para buscar verdadeira sobrevivência enquanto a guerra eclode entre os envolvidos.

Iniciadas tais medidas, a intervenção do poder estatal, através do Juiz de Direito, é inevitável e tem como foco principal não só restaurar a paz entre as partes, mas também garantir o mínimo necessário a preservar a dignidade dos envolvidos. Toma-se partido de um, em detrimento do outro, com base nos pedidos trazidos ao Judiciário e sempre com fundamento nas leis, em decisões anteriores para casos semelhantes (jurisprudência) e nas provas que foram colhidas durante todo o processo. E, de fato, por esse caminho, pela autoridade e, portanto, pela força, eventuais brigas chegam ao fim, não sem antes desafiar os tantos recursos disponíveis e as tantas possibilidades de revisões das decisões processuais.

Enfim, uma briga termina, mas o conflito persiste. O ruído na relação remanesce. O sofrimento não é amenizado com eventual vitória nas medidas judiciais utilizadas. Tudo continua igual no aspecto familiar, prejudicial a todos, sem exceção.

Antes de causar eventual mal-entendido, vale esclarecer: a busca pelo Judiciário é importante, sim, senão essencial. É um movimento brusco, utilizado por um dos envolvidos, não só para lutar por um direito que entende ter, mas também para indicar ao outro lado que seus clamores, suas necessidades e sua voz precisam ser ouvidos. Não é à toa que dizem por aí: o conflito, por vezes, é necessário para se chegar à paz.

Despindo-se de toda e qualquer conotação de violência que esta frase pode ter, o olhar deve sempre recair sobre a estrutura psíquica de cada um dos envolvidos e as respectivas conexões familiares. A compreensão destes fatores é o único caminho para a verdadeira superação dos obstáculos e, por conseguinte, do restabelecimento da harmonia.

Tantos são os meios de se buscar e de se alcançar esta dádiva da paz que não seria o caso de listá-los, um a um, sob pena de injustamente acabar por deixar de fora algum que seja tão importante ou eficiente quanto os demais. Cada pessoa ou núcleo familiar deve enveredar pelo método que lhe for mais confortável, coerente e, principalmente, crível.

Em suma, é altamente recomendável a utilização de meios alternativos de resolução de conflitos na esfera do Direito de Família, seja antes de instaurada a guerra processual, seja durante (e paralelamente) ao seu desenvolvimento. Sem o verdadeiro enfrentamento, ou, ao menos, conhecimento, das particularidades de cada incompatibilidade (ainda que momentânea), o sofrimento de todos os envolvidos permanecerá, mesmo que encerradas as medidas judiciais, mesmo que rompido o relacionamento.

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