Apesar de em voga e intrinsecamente ligado à facilidade de acesso e divulgação de informações que os meios de tecnologia – em especial a Internet – trouxeram ao cidadão comum, tanto o termo fake news quanto sua utilização não são novos, havendo registros formais desta expressão há mais de cem anos.

Aliás, é fácil constatar como essa questão não é nova: os tabloides – jornais sensacionalistas, mais preocupados em atrair o interesse do público e lucrar com publicidades, do que com a veracidade das informações – são tão antigos quanto o próprio jornal impresso.

Todavia, enquanto as notícias eram “monopolizadas” pelos meios jornalísticos impressos, televisivos ou radiodifundidas, e a fofoca (que, humildemente, me parece a melhor tradução ao citado termo), quando não difundida por esses meios, tinha curto alcance de divulgação, as fake news acabavam tendo pouco impacto na sociedade em geral.

Obviamente, todos temos exemplos de fofocas que destruíram a imagem de alguém ou de alguma empresa; mas reconheçamos que esses casos eram raros ou, pelo menos, contidos em determinados grupos sociais.

Hoje, entretanto, uma notícia falsa lançada na internet pode atingir qualquer ponto do globo e ter gravíssimas consequências. Quer um exemplo? A Associação Médica Brasileira e a Associação Paulista de Medicina1, em pesquisa realizada no último mês, aponta que 57% dos profissionais da saúde consideram que as fake news levaram algumas pessoas a minimizar ou negar as consequências da Covid-19.

Pandemia que, só no Brasil, já vitimou mais de 629.000 vidas! Se a pandemia tivesse sido levada a sério desde o início, quantas destas vidas teriam sido poupadas? Nunca saberemos.

Obviamente, e ainda bem, não são só as fake news que se disseminam facilmente com as redes sociais. Diversos movimentos sociais se organizaram e ganharam nova expressão com essas novas ferramentas de divulgação.

Inúmeras são as pessoas positivamente afetadas pela facilidade de acesso a informações, dados, materiais de estudo e, até mesmo, suporte e socorro – inúmeros são os exemplos de pessoas salvas da violência doméstica ou de situações análogas à escravidão por terem conseguido transmitir seu pedido de ajuda por esses meios.

Mas então, como diferenciar o “joio” (fake news) do “trigo” nesta nova realidade?

Esta, caro leitor, é a pergunta da vez, ainda que feita de tantas formas diferentes quantas são as opiniões existentes no mundo.

Já em 2019, a ONU, OSCE2, OEA e CADHP3 destacam a necessidade urgente e global de se proteger e promover a liberdade de expressão nos meios eletrônicos, protegendo estes mesmos meios de utilização política de fake news – ou do seu suposto combate – para atingir minorias ou assegurar a perpetuação de classes dominantes ou governos opressores e ditatoriais.

Afinal, desde 1949 – data de lançamento da obra “1984”, de George Orwell – sabemos que, nas mãos do opressor (seja ele o governo ou não), a divulgação de informações pode e será utilizada em favor da manutenção deste status quo, impondo ao cidadão a obrigação de “duplipensar” a realidade.

Um bom exemplo de como se está tentando, se não vencer, ao menos equilibrar esse verdadeiro campo de batalha informacional, são as medidas de denúncia de fake news – e outras divulgações nocivas e abjetas – e a autorregulamentação de algumas redes sociais.

Não, caro leitor, não serei leviano de acreditar que as redes sociais fazem isso de forma isenta e sem qualquer interesse escuso; muito pelo contrário, por mais “nobres” que sejam as intenções, é claro que permanece a possibilidade dos “discursos” serem talhados (e tolhidos) ao bel prazer de quem domina essas ferramentas.

Todavia, é um começo.

E, como toda mudança, já tem gerado resistências, tais como o eloquente silêncio da rede Telegram às convocações do Poder Judiciário brasileiro – especialmente no âmbito eleitoral –, preocupado com a enxurrada de fake news que, tal e como se tentou nos Estados Unidos, pode muito bem trazer impactos e causar tumultos nas eleições que se aproximam.

Honestamente, sinto-me no dever de esclarecer: não defendo a censura, muito menos acredito que a divulgação de ideias e opiniões deva passar pelo crivo prévio de quem quer que seja; entretanto, devemos ser responsáveis por aquilo que falamos, escrevemos e, especialmente, divulgamos.

Diziam os mais antigos: “Sustente em pé o que falaste sentado”.

É isso que se pede – e que, creio eu –, é o mote e justo fundamento desta discussão: se alguém quer divulgar suas ideias, opiniões e, até mesmo, tresloucadas visões “acadêmicas” ou “científicas” sobre determinada questão, por qual razão se esconde sob o manto do anonimato, atribuindo à terceiros inexistentes opiniões que são suas?

A mesma Justiça que busca coibir as fake news certamente assegurará o direito à liberdade de expressão a quem o faça de forma clara e justa, e provas disso têm-se aos montes na jurisprudência brasileira.

Mesma certeza tenho – e talvez por isso algumas pessoas não assinam o que falam – que a mesma Justiça punirá os tresloucados, os ofensores e os negacionistas, que buscam não informar ou divulgar sua opinião, mas sim prejudicar seus adversários, mesmo que à custa de milhares de vidas!

  1. Disponível em https://amb.org.br/wp-content/uploads/2022/02/Pesquisa-APM_AMB_me%CC%81dicos-e-covid-19_fev2022.pdf – acessado em 03-02-22
  2. Organização para Segurança e Cooperação na Europa, em tradução livre
  3. Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos
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