Atualmente o judiciário tem prezado bastante pelas as formas alternativas de solução de conflitos como forma de desafogar o número de processos existentes tanto nas varas cíveis quando nas varas trabalhistas; e nas varas criminais, ainda que em poucos casos.

Mais do que desafogar o Judiciário, estas medidas prestam-se a pacificar a sociedade, posto que uma solução encontrada consensualmente pelas partes (mesmo que de forma motivada), é sempre preferível e mais eficaz do que aquela imposta pelo Estado-Juiz.

Tem-se assim, a aplicabilidade das leis de Mediação e Conciliação, Lei 13.140/2015; bem como a Lei de Arbitragem, Lei 9307/1996; ambas tratam das formas alternativas de solução de conflitos hoje mais amplamente aplicadas pelo Código de Processo Civil vigente. Ambas são aplicadas de acordo com as peculiaridades da lide em tela. No caso da mediação e conciliação, o Código de Processo Civil prevê alguns momentos para sua resolução, quais sejam: a audiência de conciliação pré-processual visando a formulação de um acordo que, após homologado, se tornará título executivo que poderá ser executado judicialmente caso o acordo firmado não seja cumprido; bem como em quatro momentos processuais, quais sejam: audiência inaugural, audiência de instrução (antes da sentença); em grau recursal ou na própria execução. Entretanto, as conciliação e mediações só poderão tratar dos diretos chamados de disponíveis, ou que admitam transação, conforme artigo 3º da Lei 13.140/2018:

Art. 3o Pode ser objeto de mediação o conflito que verse sobre direitos disponíveis ou sobre direitos indisponíveis que admitam transação. 

Desta forma, temos que direitos como indenizações por danos morais, exemplo de direito disponível, e valor arbitrado para pensão alimentícia, exemplo de direito indisponível (o de receber alimentos) mas que pode ser transacionado, (o valor arbitrado) podem ser tratados pela referida lei.

Na Justiça do Trabalho também é comum que as partes tentem pela realização de acordo sobre os valores a serem pagos pelo empregador, ao empregado, entretanto, em sua totalidade, trata a Justiça do Trabalho de direitos indisponíveis, ou seja, não pode o empregado “abrir mão” do recebimento de nenhuma verba salarial, porém o valor destas verbas pode ser acordado entre as partes.

Em que pese, a Lei de Arbitragem não abrange tantas situações, seja na justiça cível, seja na justiça do trabalho, não tendo previsão legal em nenhuma das vertentes como tem-se a aplicação da mediação com a previsão no Código de Processo, até então; salvo na Justiça do Trabalho nos casos em que haja dissídio coletivo, conforme disposto pela Constituição Federal, incluída pela Emenda Constitucional 45, senão vejamos:

Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: 

IX – outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei.

§ 1º Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros.

§ 2º Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente

O artigo constitucional colacionado acima trata da única previsão legal abordada na Justiça do Trabalho para a aplicação da arbitragem, até então.

A nova CLT com a mesma forma de raciocínio do restante do judiciário previu uma forme de aplicação da arbitragem como forma de solução alternativa da lide, e ainda assim manteve a proteção do empregado. Tem-se que é possível a aplicação da arbitragem no direito do Trabalho, apenas com a expressa autorização e concordância, sem vícios, do Reclamante, e apenas nos casos em que este receba mais que duas vezes o teto dos benefícios da Previdência Social.

Art. 507 – A. Nos contratos individuais de trabalho cuja remuneração seja superior a duas vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social, poderá ser pactuada cláusula compromissória de arbitragem, desde que por iniciativa do empregado ou mediante a sua concordância expressa, nos termos previstos na Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996.

A partir desta previsão, hoje temos a expressa permissão legal para a aplicação da arbitragem nos casos de contratos individuais do trabalho, previsão que antes abrangia apenas os casos de dissídios coletivos. Esta aplicabilidade é tão cercada de restrições devido à necessidade de proteção do empregado por ser a parte mais hipossuficiente da relação de trabalho.

Neste contexto, analisa-se então a relação de trabalho e relação de emprego. A CLT trata das relações de emprego, ou seja, todos os direitos e deveres do empregado que merecem proteção jurisdicional, sendo direito indisponíveis do empregado, quais sejam: direitos a férias, ao pagamento de hora extras, aviso prévio, intervalos, etc. Em contrapartida, a relação de trabalho são os tópicos não essencialmente protegidos pela CLT, sendo que nem toda relação de trabalho pode ser uma relação de emprego. Pode-se assim concluir que os direitos das relações de trabalho, podem ser disponíveis, enquanto os direitos da relação de emprego podem ser apenas transacionáveis, mas não disponíveis.

Como já dito anteriormente, a relação arbitral pode ser aplicada apenas nos casos de direitos disponíveis, e no caso da exceção trazida pela nova CLT, conforme já mencionado. Passa-se assim, a analisar um dos principais pedidos presente nas reclamações trabalhistas, o dano moral. Caio Mário da Silva Pereira traduz sobre o dano moral o entendimento de que “qualquer sofrimento humano que não é causado por uma perda pecuniária e abrange todo atentado à sua segurança e tranquilidade, ao seu amor-próprio estético, à integridade de sua inteligência, às suas afeições, etc.”1. O Ilmo. Doutrinador Humberto Theodoro Junior, explica a responsabilidade civil do dano moral como forma de recompor dano causado:

A esfera íntima da personalidade, todavia, não admite esse tipo de recomposição. O mal causado à honra, à intimidade, ao nome, em princípio é irreversível. A reparação, destarte, assume o feitio apenas de sanção à conduta ilícita do causador da lesão moral. Atribui-se um valor à reparação, com o duplo objetivo de atenuar o sofrimento injusto do lesado e de coibir a reincidência do agente na prática de tal ofensa, mas não como eliminação mesma do dano moral.”2

Como se nota, o pedido de dano moral é algo que fere diretamente a reclamante, e que muitas vezes não trata de relação de emprego ou de trabalho, por vezes, as lides que desencadeiam o direito de percepção ao dano moral em nada se atinam à competência da Justiça do Trabalho, mas que mesmo assim ali são distribuídas e julgadas por culpa in eligiendo ou in vigilando da empregadora em face as relações entre seus funcionários, isto é, quando a ofensa ocorre entre dois empregados não em razão de suas funções, mas apenas por conta de estarem no local de trabalho.

Neste cenário, torna-se tormentosa a competência trabalhista – já que, por mais que não envolva o empregador, o dano decorre da “relação de trabalho” erigida pelo constituinte como mote a competência da Justiça Especializada.

Todavia, não há dúvidas que o referido direto é disponível – afinal não haverá hipossuficiência entre as partes a justificar a proteção um ou de outro –, tratando-se de relação entre civis (empregados) dentro do ambiente da empresa, do que relação essencialmente de trabalho ou de emprego.

Portanto, nestes casos, não se verifica razão a impedir a aplicação da arbitragem para solução destes conflitos, ainda que sob a competência da Justiça do Trabalho, por ser o direito de percepção ao dano moral um direito disponível, tem-se que é possível a aplicação da arbitragem ainda que fora dos conceitos excepcionados por Lei.

  1. Responsabilidade civil, p. 54. ↩︎
  2. Jr., T., Humberto. (07/2016). Dano Moral, 8ª edição. [Minha Biblioteca]. Retirado de https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530972295/ ↩︎
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