Desde 20 de março deste ano, data da decretação do estado de calamidade no país decorrente da pandemia da COVID-19, os condomínios vêm se adaptando diariamente às mudanças impostas pela crise sanitária. Muitos foram os reflexos no dia a dia dos condomínios, sejam residenciais, comerciais ou mistos.

Os cenários mundial e brasileiro mudam diariamente e o Legislativo não consegue acompanhá-los na mesma velocidade. Enquanto isso, operadores de direito se readequam ao novo status quo, com audiências e sustentações orais virtuais. Some-se a isso o fato de que ainda não existe jurisprudência para os casos derivados da pandemia, vez que as demandas se encontram sub judice.

Assim, diante da necessidade de uma legislação transitória, foi aprovado pela Câmara dos Deputados, na última quinta-feira (14/05), o projeto de lei do Senado PL 1.179/20, que cria regras para disciplinar as relações jurídicas privadas, tais como direito de família, contratos, relações entre condôminos, relações consumeristas, entre outras, durante a pandemia.

A seguir, passo a elencar algumas questões relacionadas aos condomínios edilícios tratadas pelo PL 1.179/20:

  1. Assembleias: caso se faça necessária a realização de assembleia até 30 de outubro, deverá ser realizada por meio virtual, independentemente de previsão na Convenção condominial. O meio virtual escolhido deve ser capaz de permitir a identificação do condômino e a segurança do voto.
  2. Mandato do síndico: se não for possível a realização de assembleia condominial por meio eletrônico, o mandato do síndico vencido a partir de 20 de março de 2020 fica prorrogado até 30 de outubro de 2020.
  3. Poderes do síndico: em caráter emergencial, até 30 de outubro, além dos poderes já conferidos pelo Código Civil, fica permitido ao síndico: (i) restringir áreas comuns para evitar propagação da COVID-19, desde que respeitado o acesso à propriedade exclusiva dos condôminos; (ii) restringir ou proibir a realização de reuniões e festividades, bem como o abrigo de veículos por terceiros, ainda que em áreas exclusivas dos condôminos.
  4. Prestação de contas: continua sendo obrigatória a prestação de contas regular dos atos da administração do síndico, sob pena de sua destituição.

Frise-se que o parágrafo único do art. 11 deixa claro que tais proibições e limitações não se aplicam ao caso de atendimento médico, tampouco realização de obras de natureza estrutural ou benfeitorias necessárias.

Vale mencionar que a restrição de reuniões e festas também atinge as áreas privativas e exclusivas dos condôminos, ou seja, apartamento ou casa, localizados em condomínio. Em que pese a observância ao direito de propriedade, vale lembrar que a OMS (Organização Mundial de Saúde) orienta que não devem ocorrer reuniões ou aglomerações no momento, a fim de evitar a propagação do vírus. Desta forma, o bem jurídico ora tutelado é a saúde de todos, portanto, nesse caso, o direito coletivo se sobrepõe ao direito individual.

Outra questão delicada é com relação ao barulho, tendo em vista que os adultos que estão trabalhando em casa, em sistema home office, querem silêncio para se concentrar. Por outro lado, os pais nem sempre conseguem conter a empolgação das crianças confinadas – e um tanto entediadas – dentro do apartamento. Há que se ter bom senso e razoabilidade antes de reclamar do barulho do vizinho neste momento. Lembrando que o direito ao sossego difere de perturbações eventuais tidas como inevitáveis, como o choro de uma criança, por exemplo. Cabe ao síndico não permitir o abuso deste direito e, para saber quando vira abuso, deve-se levar em consideração o que é tolerável ou não no momento.

O mesmo vale para a realização de “lives”, que se tornaram tão comuns desde o início do confinamento. A fim de evitar reclamações dos condôminos e até de prédios vizinhos, deve-se observar o horário, a frequência e o tempo de duração da apresentação, bem como o volume e a potência do aparelho de som. E ainda, caso a apresentação tenha como efeito secundário a aglomeração de pessoas assistindo (nas áreas comuns, por exemplo), não se recomenda sua realização.

Por fim, há outras medidas que não foram objeto do projeto de lei, mas que são fortemente recomendadas a fim de evitar a disseminação da COVID-19, tais como:

  1. Reforçar as normas de higiene aos funcionários do condomínio, disponibilizando álcool gel, máscaras e luvas;
  2. Aumentar a frequência da limpeza dos elevadores e áreas comuns;
  3. Aconselhar o uso de máscaras pelos condôminos nas áreas comuns;
  4. Limitar o número de pessoas nos elevadores;
  5. Restringir a entrada de entregadores, e até mesmo exigir o uso de máscaras, como condição para acessar o condomínio.

Quanto a barrar o ingresso de funcionários dos condôminos (diaristas, babás), entendemos que tal medida configura um excesso de poder por parte do condomínio. O mesmo vale para proibição de mudança do condômino, pois entendemos que tal medida é um abuso de poder e não se justifica.

Há outra situação bem delicada que pode vir a ocorrer. Em caso de contaminação de algum condômino, se o síndico vier a saber, por respeito à privacidade, poderá manter em sigilo a informação. No entanto, se tal condômino, através de suas ações, venha a expor os demais– ex: caso não cumpra a quarentena e/ou circule sem máscara pelo condomínio – poderá ser advertido e até mesmo multado. O interesse coletivo aqui, novamente, se sobrepõe ao individual.

Vale lembrar que o momento não é propício para demandas judiciais, e um dos objetivos do citado projeto de lei é evitar a sobrecarga da máquina do judiciário por ações provenientes da crise da COVID-19.

Desta forma, nos parece que qualquer solução negocial será sempre a melhor, já que as decisões jurídicas podem levar mais tempo que o desejado e sempre existe a possibilidade de um direito se sobrepor ao outro.

A palavra-chave diante de um conflito, seja de que ordem for, principalmente agora, deveria ser: ponderação. Há que se achar um caminho do meio, ou seja, uma solução satisfatória para ambas as partes, ainda que cada lado tenha que ceder um pouco, sempre lembrando que estamos vivendo uma situação extrema em que o antigo “normal” não é mais o atual “normal”, e ainda não sabemos qual será o novo “normal”!…

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