Durante muitos anos a Convenção de Condomínio se resumiu a reproduzir artigos de lei no que diz respeito a regulamentaçãodos direitos e deveres dos condôminos.
Inicialmente prevista em lei especial e desde 2002 regulada pelo Código Civil, a Convenção de Condomínio sempre foi considerada como “mais um documento” a ser depositado no Cartório de Registro de Imóveis. Mais preocupado com a aprovação doprojeto, com a obtenção das certidões, com a elaboração do quadro de áreas e com o custo da obra, a Convenção de Condomínio sempre foi objeto de pouca dedicação por parte do incorporador. Não raras vezes a minuta vinha emprestada de outro empreendimento. Poucos eram os empreendimentos que se tinha a preocupação de adequar a redação da Convenção ao tipo. De rara leitura, a exceção do profissional responsável pela sua elaboração, e do registrador do Cartório de Registro de Imóveis por dever de ofício, e de pouquíssima consulta, a Convenção de Condomínio muitas vezes se mostrava de difícil aplicação na prática, apresentando-se muitas vezes simplória, genérica e por vezes contraditória. Os problemas da Convenção de Condomínio acabavam se tornando bombas relógio prontas a estourar a qualquer momento. E o pior é que a explosão muitas vezes ocorria não na mão do incorporador, que já havia entregue a obra, mas do síndico e da administradora. Pois chegou a hora, e isso já vem ocorrendo há algum tempo, de se dedicar esforço intelectual, tempo e planejamento para se modernizar as regras condominiais. É certo que a modernização não significa alterar ou contrariar as previsões legais, mas sim a sua adequação a realidade em que vivemos. Estamos há tempos na era da internet, e mais recentemente do Uber e do Airbnb. Hoje tudo se resolve a um toque de aplicativo, do pagamento de uma conta a pedir um taxi. As redes sociais são onipresentes, as mensagens instantâneas fazem parte da rotina diária, o compartilhamento instantâneo de fotos e vídeos é uma realidade. Por que não prever o envio do boleto da taxa de condomínio e da convocação para a assembleia diretamente para o e-mail do condômino! Por que não prever a eleição do síndico, do subsíndico e dos membros do conselho e a aprovação de suas propostas e contas pela internet, ou através de um aplicativo. Assembleias que hoje contam com a presença de 20% a 30% dos condôminos certamente apresentarão um quórum superior a 80%, ainda que virtual. Em um futuro próximo os edifícios não terão mais garagens, ou pelo menos a quantidade que hoje se vê nos empreendimentos. As pessoas não terão mais carros próprios, elas optarão pelo seu compartilhamento. E se o Condomínio optar por ter veículos compartilhados como fica a sua regulamentação? O sinal dos tempos também aponta que os apartamentos do futuro serão muito menores e não terão espaço nem mesmo para mesas de jantar por exemplo. Os condôminos passarão a compartilhar os espaços comuns para fazer suas refeições diárias e não somente as festas. Haverá assim uma maior convivência entre as pessoas. Esse é outro ponto que precisa ser regulamentado. E o condômino, solteiro ou casado, que passa 90% do seu tempo no escritório e faz a compra de supermercado pela internet? Quem receberá o entregador e guardará a comida se não haverá mais empregada doméstica? A compra será entregue e o condomínio a guardará em local apropriado a espera do condômino no início da noite. Produtos de geladeira deverão ser mantidos resfriados, sob pena de estragarem. Mais um espaço a ser compartilhado e que necessitará de previsão convencional. Além do compartilhamento de veículos, os condomínios deverão também prever o compartilhamento de bicicletas. Vide os exemplos das grandes cidades. A Convenção deverá estar atenta a isso. E essa modernização não se aterá somente aos condomínios residenciais. A Convenção dos empreendimentos comerciais, muitas vezes compostos de hotéis, escritórios e shoppings, todos no mesmo local inclusive, também deverão se modernizar. Em menos de 10 anos a geração dos milênios estará no comando das principais empresas e certamente estará se utilizando de bicicletas, carros compartilhados, espaços comuns de convivência, cowork. Hoje já se vê muito avanço na configuração dos edifícios mais novos. Ocorre que ao se ler a Convenção desses Condomínios verifica-se que o texto mantem-se aquele que repete os artigos do Código Civil, cuja assembleia ainda ocorre no foyer com meia dúzia de condôminos e uma garrafa de café frio e suco de uva, e o boleto é encaminhado pelo correio, não havendo nem mesmo previsão para coleta seletiva de lixo ou compostagem. É hora de se renovar a Convenção de Condomínio adequando-a ao fenômeno da “uberização” que está a tomar conta de todos nós.
Advogado Sócio da Advocacia Hamilton de Oliveira. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-CAMPINAS). Administrador de empresas pela Fundação Getúlio Vargas (FGVSP). Especialista em Direito Contratual pelo Centro de Extensão Universitária (CEU). Especialista em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Das suas passagens profissionais, vale destacar atuações junto ao Banco Mercantil de São Paulo (hoje Banco Bradesco), junto à Arthur Andersen (hoje Deloitte Touche Tomatsu) e junto ao Banco e Corretora Patente S/A.
Tem dedicado sua prática à área do Direito Empresarial e ao Direito Civil, especialmente no ramo do Direito Imobiliário com ênfase em incorporação imobiliária e condomínio edilício.
Membro do Conselho Deliberativo da OABPrev-SP no triênio 2021/2023.
Idiomas: Português e Inglês.